24 de abril de 2016
O varejo não é mais um negócio de comprar e vender produtos.Novos modelos de negócios permitem que as empresas do setor gerem receita de outras maneiras
Se você perguntar para 10 pessoas o que é o varejo, as 10 responderão algo parecido com “um negócio de vender produtos para clientes”. Uma das frases famosas de Samuel Klein, por sinal, ia nessa linha: “meu negócio é comprar por 100 e vender por 200”. O varejo era um pouco mais complexo que isso, mesmo na época em que Klein era um mascate nas ruas de São Caetano, mas hoje em dia o negócio é beeeeem mais complicado.
Simplesmente porque o varejo é cada vez menos um negócio de vender produtos. O varejo tem se tornado, para muitas empresas, a ponta do iceberg no relacionamento com os clientes. O dinheiro “de verdade” vem de outros lugares.
Vejamos a Amazon. A empresa é a maior varejista online do mundo e, somando seu marketplace, já fatura anualmente mais que o Walmart. Entretanto, o desempenho de sua operação varejista é subsidiado pela AWS, a divisão da empresa responsável pelos serviços de internet e cloud. No primeiro trimestre de 2015, pela primeira vez a Amazon separou seus resultados de varejo e internet, mostrando que o faturamento de US$ 22,7 bilhões e o prejuízo líquido de US$ 57 milhões escondiam o fato de que a área de serviços (AWS) vinha financiando a operação de varejo e os altos custos logísticos da operação. Já no segundo trimestre deste ano a operação de varejo nos EUA teve um resultado operacional positivo, por não ter investido pesadamente em infraestrutura. A conta não fecha, a não ser que financiada por outro braço da empresa.
A questão é que a Amazon não pensa no varejo como uma atividade isolada. Para Jeff Bezos, o importante é que a “plataforma Amazon” como um todo gere resultados, mesmo que uma área precise, para isso, financiar outra. O objetivo é fazer com que o cliente que compra online experimente os vários serviços da empresa e utilize-os mais e mais. O preço mais baixo de hoje, ou a assinatura anual que oferece frete grátis e não se justifica isoladamente, é compensado pelo volume de negócios que o cliente faz com a empresa ao longo do tempo.
Algo semelhante ocorre na Apple, em que as lojas físicas (ainda que estejam entre as de maior faturamento por metro quadrado no varejo americano) são apenas parte do relacionamento dos clientes com a marca. Ou mesmo em um dos conceitos varejistas mais interessantes dos últimos anos, a americana Story. A empresa se define como uma revista que a cada edição muda completamente seu tema, contando histórias diferentes a cada seis semanas. Assim, o mix de produtos muda completamente de um ciclo para o outro. O segredo é que a operação não se paga pela venda de produtos e sim pelos acordos de marketing feitos com as marcas que expõem o mix no PDV.
A conclusão é que pensar o varejo somente como compra e venda de produtos é limitar sua visão. Que tal pensar o PDV como um espaço de relacionamento e serviços, no qual é possível vender produtos, mas que também abre oportunidades para novas formas de relacionamento e geração de receitas?
Renato Müller é co-founder da Käfer Content Studio.