9 de junho de 2016
Sem ideias novas, não há inovação, apenas crise. Por isso, o movimento recente do varejo na criação de labs é extremamente positivo.
Vivemos mais um período de crise econômica. Na história brasileira, períodos de crescimento contínuo (como o da década passada) são raros, mas o fato é que ficamos mal acostumados. Depois de um período de expansão que parecia garantido, voltar à realidade de “vender o almoço para garantir o jantar” não é uma experiência agradável.
Existe, porém, um problema de percepção que faz com que as crises pareçam ser ainda piores do que são. A dinâmica do capitalismo praticamente garante a oferta ampla e irrestrita de crises, mas nós, em nosso otimismo, teimamos em achar que as vendas sempre crescerão e os lucros serão cada vez maiores. Em todas as crises econômicas, no Brasil e no mundo, um componente importante é a falta de visão de empresários e investidores, que esperam lucros crescentes quando o próprio sistema econômico caminha na direção contrária.
Lamento acabar com ilusões, mas em qualquer ramo de negócio a tendência é o lucro zero.
Isso quem explicou foi Karl Marx, lá nos idos de 1850. Para simplificar, o aumento da concorrência em qualquer ramo de atividade leva à criação de produtos cada vez mais parecidos, à comoditização da oferta e, assim, a uma pressão sobre as margens e à redução do lucro. Com a automação dos processos produtivos, a taxa geral de lucro tende a diminuir, uma vez que as margens brutas são maiores em setores onde existe mais mais-valia (a parte não paga dos salários dos trabalhadores). Sem lucro, há crise.
A saída para romper esse círculo foi dada por Joseph Schumpeter, há cerca de 100 anos. Em sua Teoria do Desenvolvimento Econômico, ele argumenta que a inovação é o motor do desenvolvimento dos negócios, uma vez que reorganiza as atividades produtivas e provoca a evolução do sistema econômico. Uma inovação pode ser uma nova característica em produtos existentes, uma nova forma de produção para os produtos atuais ou a abertura de novos mercados a partir de inovações disruptivas. Ao entrar em novos mercados (os “oceanos azuis”, para usar um termo mais recente), as empresas encontram amplas possibilidades de geração de receitas e lucros, que, com a entrada de novos players, se tornarão menores. Afinal, o bolo precisará ser dividido entre mais empresas.
Entendendo essa dinâmica dos negócios, percebemos que o ciclo “inovação / lucros altos / aumento da concorrência / lucros declinantes / inovação” é contínuo e nunca encontra um ponto de equilíbrio. Determinados setores conseguem, por força de regulamentações, desacelerar esse processo, mas acabam sucumbindo (as operadoras de telecomunicações e os taxistas não nos deixam mentir). Outra forma de desacelerar esse ciclo é investir em eficiência, que permite, por algum tempo, extrair o máximo de cada processo de negócios, mas que se esgota mais cedo ou mais tarde.
Dessa maneira, sempre existirá crise para alguém, em algum lugar, em algum momento. Ao mesmo tempo, existe alguém gerando inovações e criando formas de fazer negócios que rompem com os atuais paradigmas e geram mercados novos. Se crises são constantes, a busca pela inovação também deveria ser contínua. Por isso, o movimento recente do varejo na criação de labs que incorporam o jeito de pensar das startups de tecnologia é extremamente positivo, pois fomenta o germinar de novas ideias. E, sem ideias novas, não há inovação, apenas crise.
Em todo o mundo, empresários de todos os setores diariamente encaram uma escolha: permitir que a crise chegue ou se antecipar a ela, procurando inovação. Quem descansa sobre os louros será, mais adiante, engolido por alguém mais rápido e inovador. Na última década, os varejistas que não se preocuparam em aproveitar os bons ventos para incorporar tecnologia, entender melhor o comportamento dos clientes e extrair inteligência dos dados disponíveis são os que estão sentindo mais forte os efeitos do desaquecimento da economia. Isso vale para o Brasil, para os Estados Unidos e para todo lugar.
Uma lição que a atual crise deveria deixar: já comece a se preparar para a próxima crise, pois ela certamente virá. Entenda que as crises políticas e econômicas fazem parte da dinâmica do mercado e não procure desculpas externas para o desempenho de seus negócios. Faça a sua lição de casa. Busque inovação constantemente, ouça os clientes, esteja próximo deles, estimule a geração de ideias (e aceite que muitas delas não darão certo). Teste, erre, teste novamente, até acertar. Crie uma cultura corporativa que abrace tanto a crise quanto a inovação.
Quando encontrar o sucesso, não pare: continue buscando a inovação e tenha a coragem de mudar enquanto sua posição ainda é confortável. É melhor ser o líder e criar algo novo do que só pensar nisso quando foi atropelado pelos avanços do mercado. Então mexa-se!
Renato Müller é co-founder da Käfer Content Studio.
Publicado originalmente no portal O Negócio do Varejo